sexta-feira, junho 08, 2007

O ABUSO SEXUAL NA FALA DOS EDUCADORES

A partir dos dados colhidos por meio das entrevistas com os educadores, foi observado que a idade dos entrevistados variou entre 21 e 46 anos, sendo que a faixa etária de maior concentração foi de 21 a 30 anos.
De posse dessas informações, partiu-se para a qualificação profissional dos entrevistados, no qual foi verificado que, dentre estes, 18 são graduados em Pedagogia e 14 estão ainda em formação no mesmo curso.
Com relação a cursos de aperfeiçoamento, os dois mais citados foram: PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais) e PROFA (Programa de Formação de Alfabetizadores), ambos realizados através da Secretaria Municipal de Educação, sendo que todos os entrevistados afirmaram ter participado dos mesmos; nenhum deles mencionou algum curso de especialização.
Não houve referência, por parte dos entrevistados, quanto à participação em algum curso de orientação sexual.
No que se refere ao tempo de atuação em sala de aula, este variou dos 03 aos 19 anos, verificando-se que a maior concentração ficou entre 03 e 10 anos.
Partindo para as questões específicas do estudo, tratamos inicialmente do conhecimento geral acerca da legislação de proteção à criança (o questionamento visava avaliar o nível de conhecimento, principalmente referente à violência doméstica).
Com relação ao conhecimento do Estatuto da Criança e do Adolescente, 20 entrevistados afirmaram já ter lido e compreenderem algumas partes do ECA; sendo que os demais, no total de 12, afirmaram ter conhecimento apenas da existência dessa lei.
Com relação às questões específicas que tratam da violência doméstica contra criança, somente 03 entrevistados fizeram citações do tipo: “tenho o conhecimento que no Estatuto fala que no caso do pai ou padrasto abusar de uma criança, ele deve ser afastado da convivência com essa criança” (Dulcinéia, 43 anos). Provavelmente, a pessoa deve ter se baseado no art. 130 do ECA, que diz “Verificada a hipótese de maus tratos, opressão ou abuso sexual, impostos pelos pais ou responsáveis, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum” (Cury et al: 2000, p. 119). Ou até mesmo, esse entrevistado pode ter feito essa referência baseado em fato ocorrido há pouco tempo e que teve repercussão no âmbito do município.
Um dado observado também é que, na maioria das vezes, o Estatuto é visto de uma forma distorcida – os educadores entendem que essa lei só prevê os direitos e que não aponta os deveres: “eles (os alunos) podem tudo em sala de aula, inclusive chamar palavrão e até bater, enquanto a gente não pode nem segurar no braço (deles) com força, e isso dificulta ainda mais o nosso trabalho” (Antonia, 35 anos). Esses dados, inicialmente, deram pistas do pouco conhecimento que os educadores demonstraram da legislação relativa à criança.
No que se refere ao conhecimento acerca do abuso sexual, apenas 07 dos participantes se mostraram capazes de fornecer alguma informação referente ao tema, que estivesse contida no ECA Um dos entrevistados mencionou que violências do tipo abuso sexual acontecem principalmente em lares dos seguimentos mais pobres da população: “isso acontece muito mais nessas casas que dormem todo mundo junto, que as crianças não têm o quarto delas (Marisa, 39 anos)”. Os demais não verbalizaram ou não foram capazes de fornecer nenhuma indicação sobre o conhecimento do assunto; no entanto, não foi possível distinguir o motivo – se por desconhecimento do tema ou por não saber se colocar em relação ao assunto em discussão.
No que se refere às prováveis atitudes que os entrevistados tomariam frente a casos de abuso sexual, 19 dos entrevistados disseram que “tomaria algum tipo de atitude”; porém, não especificaram qual seria a atitude que tomariam. Dentre os participantes, 03 citaram atitudes tais como “chamar os pais para uma conversa”, ou tentar ajudar a criança em sala de aula; 03 fizeram citações do tipo: “prefiro mandar pra psicóloga, que tem mais habilidade com esses assuntos” – essa atitude abre precedentes para duas hipóteses: a primeira, de que esse assunto não é visto como atribuição do professor; a segunda, de que ainda persiste o entendimento de que o aluno deve ser visto de forma compartimentalizada”.
Dos demais entrevistados, somente 02 tomariam a atitude de denunciar e apenas 01 afirmou que procuraria o Conselho Tutelar, dizendo, inclusive, que o ECA fala sobre esse tipo de providência – essa atitude evidencia certo conhecimento do Estatuto que, em seu art. 56 prevê que os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao conselho tutelar ocorrências de maus tratos envolvendo seus alunos. Os demais entrevistados, ou seja, 06 deles, disseram não saber o que fariam frente a esses “problemas”. No discurso de 25 entrevistados, as afirmações não foram bem fundamentadas; em alguns casos, a resposta estaria sendo influenciada por algum fato sabido, por exemplo, através de algum meio de comunicação, porém, sem nenhuma base relacionada ao procedimento correto, o que demonstra que a maioria dos entrevistados não domina informações sobre o conteúdo do ECA.
Com relação às informações sobre casos de abuso sexual, dos participantes que informaram ter obtido informações sobre casos, 06 tinham conhecimento de casos, porém não quiseram especificar a procedência da vítima, ou seja, informar se o caso relatado envolvia criança de sua turma, de sua própria família, de vizinhos, parentes etc. Aconteceram, ao longo das entrevistas, várias falas que sugeriam o medo de envolvimento, como por exemplo: “questões que envolvem família e sexualidade, são complexas e muitas vezes se tem medo de comprometer-se” (Odete, 29 anos); “esses assuntos são meio complicados, envolve justiça...” (Flávia, 21 anos); “pra ser sincera, eu não me sinto à vontade para falar desses assuntos” (Maria do Céu, 46 anos). 01 entrevistado demonstrou distanciamento do tema: “eu só vi coisas assim na televisão, no programa do Datena” [referência ao programa televisivo “Brasil Urgente”, veiculado pela emissora Band] (Bento, 43 anos). Foram feitas três referências a casos que se vê no dia-a-dia, através da mídia, sem, no entanto, mencionar fontes específicas de conhecimento.

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