quarta-feira, outubro 14, 2009

Aspectos da sexualidade na Infância e as dificuldades de pais e educadores

O desejo de desenvolver esse projeto sobreveio da necessidade de abrir espaços de discussão e debate com as famílias e os educadores desta instituição acerca do lidar cotidiano com as crianças aqui matriculadas. Através de encontros semanais que envolveram mães e/ou responsáveis por crianças na faixa etária de zero a seis anos, destacamos alguns pontos relacionados ao tema sexualidade infantil a partir de minha prática de alguns anos inserida neste contexto educacional, sobretudo nas escutas cotidianas de pais e educadores quanto às dificuldades enfrentadas na educação de seus filhos. Os conflitos e medos quanto à “fórmula correta” de lidar com a educação das crianças, sobretudo quanto a sua sexualidade são quase sempre os assuntos mais abordados e as perguntas mais freqüentes se originam do como se comportar diante de determinada situação.
A sexualidade gera dúvidas, inquietações, medos e inseguranças, sobretudo por resultar da forma como foram vividos os sentimentos na infância, adolescência e maturidade deste adulto, que por sua vez, provavelmente teve pouca orientação relativa ao lidar com desejos próprios e do outro. Dessa forma, quando os seus desejos particulares estão indefinidos ou são pouco conhecidos torna-se mais difícil lidar com os sentimentos do outro.
Há setenta anos Freud falecera e já deixava naquela época uma sociedade impactada quando descrevendo suas idéias, afirmou a existência de uma sexualidade infantil. Nos dias atuais quando a sexualidade passa a ser tema transversal nas escolas, sente-se cada vez mais a necessidade de um trabalho que envolva toda a comunidade escolar partindo da criança, avançando para o educador e sobretudo envolvendo a família que, pega de surpresa por essa nova realidade, toma consciência que efetivamente o direcionamento que precisa dar, a partir de então, vai de encontro a antigas formas, tabus e preconceitos que se mantêm ainda no contexto de um modelo que não atende mais as necessidades e demandas do mundo contemporâneo e globalizado no qual a criança tem acesso com mais facilidade a um conjunto enorme de informações e sofre um bombardeio quase ininterrupto de influências pelos mais diversos meios de comunicação.
Desse modo, acreditamos e defendemos que se a família não tomar o controle da situação, e assumir a responsabilidade pela base da educação de seus filhos estes certamente apreenderão a sexualidade cada vez mais precocemente e de forma inadequada, sendo que, estas concepções aprendidas de forma inadequada trarão grandes prejuízos à vida sexual a ser vivida no futuro.
Na nossa prática profissional nos deparamos com dúvidas simples desde o responder ao filho como este foi concebido, até quanto a pais que se sentem confusos quanto ao como se comportar diante de um adolescente que começa a namorar. Estes conflitos como já mencionamos, são oriundos da própria sexualidade do adulto.
Muitas vezes o tema chega a ser abordado de forma tão complexa que poderíamos afirmar que ao se deparar com a possibilidade de vir a ser pai ou mãe far-se-ia necessária uma tomada de consciência da nova função e uma reflexão acerca dos novos papéis a serem desempenhados.
Diríamos ainda que com a chegada de mais um membro na família nasce também uma sexualidade que é tão natural e inerente ao ser humano quanto a própria vida e isso deve ser recebido com conhecimento, segurança e naturalidade.
A sexualidade do ser humano sempre foi tratada como algo que se faz, porém não se fala; é assunto velado, contido, que se evita trazer à tona por medo ou vergonha, no entanto, essa insegurança, na maioria das vezes, é sinônimo de desconhecimento.
A partir do momento que se conhece com mais profundidade o tema da sexualidade e esta passa a ser considerada como uma prática normal e desejável a todo e qualquer ser humano, mais liberdade e segurança se adquire para se lidar com tal temática.
Por ser a sexualidade algo natural, ou seja, por ser algo que existe a partir do nascimento até a morte do indivíduo, a educação sexual deve ser pensada no ser humano a vida inteira, dada a incompletude desse ser.
O discurso do “não ter aprendido cedo” por isso “não saber orientar” deve ser esquecido e dar lugar ao buscar, ao tomar pra si a responsabilidade de informar-se e aprender, haja vista estarmos sempre aprendendo nesse processo inacabado do ser humano.
O modo como foi aprendida esta sexualidade é cultural e essa cultura vai influenciar por toda a vida do ser, porém, necessário se faz compreender a criança neste contexto visando educá-la cada vez mais de modo mais humano para que esta possa assimilar novas formas de convivência, de lidar com seu corpo e o corpo do outro, com sua vida e a vida do outro.
Educar para uma sexualidade sadia é educar para a vida com a responsabilidade de quem repassa para o filho o modo de se comportar em família, na escola, na sociedade.
Sexualidade também e essencialmente deve ser passada para as crianças, sobretudo como sinônimo de carinho, afetividade, respeito, de amor ao outro pois é a forma dissociada desses sentimentos como tem sido passada que vem fazendo o jovem cada vez mais vulgarizar e banalizar sua vida afetiva e sexual, iniciando-a precocemente, de forma incorreta e até perigosa, transformando-se em pais e mães inexperientes e sem condições de exercer seus papéis de modo adequado e suficientemente preparado para educar a sua prole.
Ao afirmar que a sexualidade surge a partir do nascimento poderíamos voltar e defender que na verdade, a sexualidade começa ainda antes, na própria concepção e durante toda a gestação quando os pais iniciam suas escolhas quanto ao enxoval e sua cor, comumente azul para menino e rosa para menina, numa clara demonstração de que já passam a determinar e induzir o que é ser um menino ou ser uma menina.
A forma pela qual a família conduz o menino ou a menina a realizarem atividades domésticas também é determinante no processo de educação sexual visto que se colocadas estas atividades como de ambos inicia-se o processo de desmistificação de papéis pré- estabelecidos como trabalho de menina ou do menino.
Nas escolas e especialmente nas creches, ainda é comum educadores se escandalizarem ao presenciarem cenas como crianças acariciarem o seu órgão genital, curiosidades de olhar o corpo do outro, meninos compararem o tamanho do pênis, e até se dois meninos ou duas meninos trocam algum tipo de carícia. Nestes casos específicos os educadores precisam sentir-se mais à vontade a ponto de entender que tais atitudes, na verdade, fazem parte das descobertas e curiosidades características dessa fase. É aconselhável que se tenha um olhar mais atento a uma criança que aos cinco ou seis anos ainda não demonstra nenhuma curiosidade pois esta sim deve ser mais observada e estimulada a participar da convivência com outras crianças.
O lidar com a sexualidade passou por mudanças significativas se lembrarmos que há bem pouco tempo ainda se dizia para criança que a cegonha a trouxe ou que um avião a deixou cair. Podemos pensar hoje que com o acesso a uma gama enorme de informação, através da mídia, é pouco provável que uma criança acredite ainda nessas explicações, além do mais, quando crescida, ela entenderá também que seus pais não foram tão sinceros com ela.
Ao receber explicações pouco convincentes e baseadas em fantasias e construções fantásticas, o que fica para o filho ou filha é que a sinceridade não prevaleceu, pois conseguem detectar uma série de equívocos desde a mentira, que seria negação ou omissão da verdade, até as mais diversas construções equivocadas. Dessa forma, o melhor caminho é o da sinceridade, sem rodeios e com o cuidado de observar que tipo de pergunta foi feita, o que deseja a criança. Muitas vezes tenta-se responder questões bem além do que a criança necessita ou é capaz de absorver.
A verdade com simplicidade e clareza da forma que se sabe deve ser dita pelos pais, os primeiros educadores na escala das responsabilidades, em seguida, virão os professores.
Ainda seguindo Freud podemos dizer que é pela boca que a criança entra em contato com o mundo; através do choro, da alimentação; que no seu primeiro ano de vida é ela sua fonte de prazer; em seguida, o controle dos esfíncteres surge como mais uma etapa do desenvolvimento infantil quando esta passa a obter prazer a partir da eliminação ou retenção das fezes e da urina; por volta dos quatro anos, para mais ou menos, esta começa descobrir seu órgão sexual e a diferença entre o menino e a menina.
Tal descoberta então, não deve ser cerceada, ou cercada de culpa e timidez, há que se encarar a descoberta da sexualidade como um momento natural e tão importante quanto todas as outras descobertas da criança, como o tomar consciência de si, dos outros e do mundo que o rodeia. A sexualidade enfim, faz parte e atravessa toda a vida do indivíduo, por isso não pode ser encarada como um tema tabu ou segredo que deve ser escondido a “sete chaves”.
Quanto mais a sexualidade for discutida de maneira aberta por pais e filhos, professores e alunos etc, maiores as chances de criarem-se indivíduos sadios, realizados e felizes.

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